MP e PJ de acordo sobre competências
Conflito foi ontem discutido durante quase seis horas
00h29m
NELSON MORAIS E SUSANA OTÃO
Os dirigentes do MP e da PJ chegaram a acordo, ontem, sobre a interpretação da Lei da Organização da Investigação Criminal (LOIC). Nomeadamente, no ponto da lei que atribui competência à PJ sobre investigações de crimes que o MP tem entregado à PSP e à GNR.
Ao fim de quase seis horas de reunião, a Procuradoria-geral da República emitiu um breve comunicado garantindo que aqueles dirigentes conseguiram esclarecer "algumas dificuldades na articulação entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária, tendo-se obtido consensos na interpretação de algumas disposições legais, designadamente a LOIC".
As interpretações divergentes desta lei estão no centro do conflito institucional que justificou a reunião. O MP terá admitido que a LOIC nem sempre tem sido lida à letra pela Unidade de Combate ao Crime Especialmente Violento, dirigida pela procuradora Cândida Vilar e integrada no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa. De resto, segundo apurou o JN, também foram levadas para a reunião algumas queixas do DIAP de Sintra, por causa de processos que o coordenador deste departamento entende serem da sua competência, mas que são investigados no DIAP de Lisboa. O DIAP de Sintra é responsável por investigar crimes ocorridos entre Sintra e a Amadora.
Cândida Almeida, que é directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e, há dois meses, agudizou o conflito com declarações públicas contra elementos da Unidade Nacional contra a Corrupção, da PJ, não terá assumido qualquer desrespeito pela LOIC.
De todo modo, o comunicado emitido dá conta de um acordo para a realização futura de reuniões trimestrais entre o DCIAP e DIAP de Lisboa e as unidades da PJ também sediadas em Lisboa (as do combate à Corrupção, à Droga e ao Terrorismo e a Directoria de Lisboa). A longa discussão entre os dirigentes da PJ, liderados por Almeida Rodrigues, e do MP, por Pinto Monteiro, ter-se-á concentrado nos problemas identificados na área de Lisboa. O quarto e último ponto do comunicado afirma que "da reunião saiu fortalecida a conjugação de esforços do MP e da PJ para uma melhor investigação da criminalidade mais grave e complexa".
Debate de temas sobre a Policia Judiciária, investigação criminal, prática judiciária e temas de direito. Se quiser enviar artigos: invescriminal@gmail.com
sexta-feira, 30 de abril de 2010
Uma questão de silvicultura
Não se pode confundir a árvore com a floresta
29-Abr-2010
O diretor da Polícia Judiciária diz que não se pode confundir "a árvore com a floresta" quando se analisam os conflitos entre a PJ e o Ministério Público (MP) que hoje serão discutidos numa reunião com o procurador geral da República.
"Nunca poderemos confundir a árvore com a floresta. Ainda que haja um problema pontual, pensamos que será desta forma, frente a frente e olhos nos olhos, que se poderão aclarar dúvidas", disse Almeida Rodrigues à agência Lusa.
O procurador geral da República (PGR), Pinto Monteiro, admitiu que o mal-estar entre magistrados do MP e a Polícia Judiciária (PJ) tem "dezenas de anos" e marcou uma reunião com o diretor da PJ e seus adjuntos na presença dos procuradores gerais distritais e magistrados do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa.
O responsável da PJ garantiu à Lusa que "tudo será feito" para que Ministério Público e Judiciária "possam trabalhar, cada um no exercício das suas competências, para que Portugal tenha um melhor Justiça penal".
Questionado sobre algumas divergências de opiniões entre magistrados e investigadores, o diretor da Judiciária considerou-as normais e salutares.
"Em qualquer equipa que esteja a funcionar bem, de vez em quando há ideias que são divergentes, mas é desta diferença de opiniões, desta pluralidade de ideias que surgem os bons trabalhos", disse o responsável da PJ, mostrando-se convicto que com o MP as coisas também podem funcionar assim.
Porém, Almeida Rodrigues lembrou que entre o detentor da ação penal (MP) e a Judiciária "não há uma relação hierárquica, mas uma parceria estratégica extremamente importante" para o combate ao crime mais grave e complexo.
Entretanto, o deputado social-democrata Fernando Negrão, ex diretor da PJ, admitiu que o mal-estar entre a Judiciária e o MP possa ter prejudicado algumas investigações e pede bom senso e sabedoria para superar os conflitos.
"Com as proporções que atingiu nos últimos tempos, admito que possa ter prejudicado algumas investigações", disse Fernando Negrão à Lusa.
Fernando Negrão admitiu que também houve conflitos quando foi diretor da instituição e até os considerou "inevitáveis", já que a investigação "é uma realidade dinâmica onde há opiniões divergentes".
Contudo, acrescentou, "para que os conflitos possam ser superados é necessário haver sabedoria da parte de todos para entenderem essa realidade".
29-Abr-2010
O diretor da Polícia Judiciária diz que não se pode confundir "a árvore com a floresta" quando se analisam os conflitos entre a PJ e o Ministério Público (MP) que hoje serão discutidos numa reunião com o procurador geral da República.
"Nunca poderemos confundir a árvore com a floresta. Ainda que haja um problema pontual, pensamos que será desta forma, frente a frente e olhos nos olhos, que se poderão aclarar dúvidas", disse Almeida Rodrigues à agência Lusa.
O procurador geral da República (PGR), Pinto Monteiro, admitiu que o mal-estar entre magistrados do MP e a Polícia Judiciária (PJ) tem "dezenas de anos" e marcou uma reunião com o diretor da PJ e seus adjuntos na presença dos procuradores gerais distritais e magistrados do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa.
O responsável da PJ garantiu à Lusa que "tudo será feito" para que Ministério Público e Judiciária "possam trabalhar, cada um no exercício das suas competências, para que Portugal tenha um melhor Justiça penal".
Questionado sobre algumas divergências de opiniões entre magistrados e investigadores, o diretor da Judiciária considerou-as normais e salutares.
"Em qualquer equipa que esteja a funcionar bem, de vez em quando há ideias que são divergentes, mas é desta diferença de opiniões, desta pluralidade de ideias que surgem os bons trabalhos", disse o responsável da PJ, mostrando-se convicto que com o MP as coisas também podem funcionar assim.
Porém, Almeida Rodrigues lembrou que entre o detentor da ação penal (MP) e a Judiciária "não há uma relação hierárquica, mas uma parceria estratégica extremamente importante" para o combate ao crime mais grave e complexo.
Entretanto, o deputado social-democrata Fernando Negrão, ex diretor da PJ, admitiu que o mal-estar entre a Judiciária e o MP possa ter prejudicado algumas investigações e pede bom senso e sabedoria para superar os conflitos.
"Com as proporções que atingiu nos últimos tempos, admito que possa ter prejudicado algumas investigações", disse Fernando Negrão à Lusa.
Fernando Negrão admitiu que também houve conflitos quando foi diretor da instituição e até os considerou "inevitáveis", já que a investigação "é uma realidade dinâmica onde há opiniões divergentes".
Contudo, acrescentou, "para que os conflitos possam ser superados é necessário haver sabedoria da parte de todos para entenderem essa realidade".
sábado, 17 de abril de 2010
A PUUUUUU (Policia única)
"Uma polícia única resolve problemas"
Francisco Oliveira Pereira, director nacional da PSP, diz que a eventual unificação com GNR e PJ, dando origem a um corpo de polícia com vertentes de investigação e patrulhamento, é “questão política” mas, “provavelmente”, a solução para travar dispersão de meios e dar melhores condições de vida aos polícias
Correio da Manhã – No contexto actual qual é o papel da PSP no combate à criminalidade violenta?
Oliveira Pereira – É determinante, na dependência funcional do Ministério Público (MP). A PSP tem preferencialmente áreas urbanas. Ali estão bairros e zonas sensíveis, focos de instabilidade e, por vezes, de grande perturbação pública. Estamos a atingir objectivos, com uma monitorização permanente, um policiamento de proximidade dirigido e repressão coordenada e proporcional. Temos tido sucesso nisso.
– MP e PJ atacam-se frequentemente por causa da atribuição à PSP e GNR de investigações que a lei orgânica diz serem da competência exclusiva da PJ, como os crimes com armas de fogo.
– É verdade, mas o MP também pode delegar noutras forças essas atribuições. Pode haver aqui alguma contradição, mas não sou jurista. A realidade é esta. E o MP tem utilizado esse processo para delegar na PSP muitas investigações.
– A aposta na investigação não põe em causa a vertente de segurança pública, o patrulhamento?
– De maneira alguma. É indissociável a investigação criminal da ordem pública – pessoal no terreno, informações dos agentes que andam na rua. No combate ao crime violento, um factor para o sucesso é o de haver boas e melhores informações policiais.
– Precisa de mais agentes?
– Preciso sempre. Vai haver, a curto prazo, uma nova escola. Está a decorrer um curso de investigação criminal. Temos orientado todo o esforço em virtude das nossas competências – e naquelas que nos são delegadas pelo MP.
– Existe uma guerra de protagonismo entre polícias, com prejuízo das investigações em causa?
– Custa-me a acreditar, pois o MP, como entidade reguladora, faz o seu papel. Mas é natural que, pontualmente, haja um ou outro conflito menos agradável.
– Como funciona a partilha de informações entre a PSP e GNR?
– Nunca funcionou tão bem como nos últimos dois anos. Há uma disponibilidade completamente diferente, incentivada pelo secretário-- geral da Administração Interna.
– Essa partilha existe em relação à PJ, com mais competências mas menos meios no terreno?
– Sim, diariamente comprovada. Quando as competências são da PJ, são-lhe transmitidas as informações. Não quer dizer que funcione em pleno, mas é obrigatório que exista. Os resultados são evidentes.
– Seria útil a PSP ter meios para efectuar as suas escutas telefónicas, perícias a armas e na área de lofoscopia (impressões digitais), tornando-se independente da PJ?
– Em relação às armas estamos a estudar uma eventual proposta nesse sentido. Era capaz de dar uma maior eficácia. Quanto às escutas e lofoscopia, também seria uma solução que cada um de nós pudesse ter a sua autonomia.
– Como encara uma possível unificação de polícias, originando uma polícia nacional, com vertentes de investigação e de policiamento?
– Tenho uma opinião muito particular, mas, sendo uma questão política, não vou poder dizê-la na condição de director nacional.
– Num país pequeno, de fracos recursos, justifica-se uma duplicação de meios com a GNR no que diz repeito às operações especiais?
– Há duas forças com áreas distintas de actuação, competências distintas e, naturalmente, quer a GNR quer a PSP, se querem uma polícia integral, têm de ter todos os meios à disposição para fazer face ao crime violento.
– Sendo os agentes mal pagos, a unificação, sem esta dispersão de meios financeiros, não permitiria melhores condições de vida para os polícias, por exemplo?
– Pois, provavelmente essa solução iria resolver uma séria de problemas. Repito: é uma questão política, não me pronuncio.
– Agrada-lhe o modelo de polícia única em países estrangeiros?
– Apenas de um ponto de vista técnico, posso avaliar a experiência dos outros países, reconhecendo neles virtudes...
'MAIS AGENTES A COMETER CRIMES, MAS PUNIDOS'
CM – Os sindicatos pronunciam-se muitas vezes sobre questões operacionais e não laborais.
– Esse é o paradoxo. A que propósito? São muitas vezes dadas opiniões desajustadas por questões operacionais e os sindicatos devem preocupar-se com as condições de trabalho dos polícias.
– E nesse aspecto têm razão?
– Têm. Foram descuradas durante muitos anos as questões de manutenção e criação de novas infraestruturas, de dignificação de espaços de trabalho da polícia.
– Mas onde mais lhes dói é nas condições salariais. Os polícias ganham manifestamente mal.
– É uma realidade também.
– Os subsídios de risco...
– Sou contra subsídios de risco. Sou é por um vencimento digno e compatível com o risco, com a ameaça, com as agruras de trabalhar por turnos. Isso deve ser pago, não à custa de subsídios.
– E está a ser pago?
– Não, acho que fica aquém daquilo que podia ser. Mas essa é uma negociação da direcção da polícia com o Governo e o MAI está sensível a essa problemática.
– Com o poder que os polícias detêm, as dificuldades económicas por que passam não os tornam mais permeáveis a cometer crimes como corrupção?
– Não acredito que as pessoas, por terem mais ou menos capacidade económica, tenham mais tendência para se deixarem corromper. A PSP tem o controlo do IGAI, do MP, mas também interno. Em 2009 tivemos oportunidade de enviar para aposentação compulsiva 15 elementos policiais e, para demissão, 24.
– Por crimes cometidos?
– Por crimes, vários. É a prova – e nunca num ano anterior tinha ocorrido um número tão elevado – de que temos os mecanismos e estamos a utilizá-los.
– Mas é também a prova de que há mais polícias a cometer crimes.
– É provável, mas são punidos.
'ARTICULAÇÃO COM OUTROS PAÍSES'
CM – Portugal é um país seguro?
O.P. – As provas são, até, internacionais. Em termos mundiais, estávamos em 9º lugar entre os países mais seguros e, a nível europeu, estamos muito abaixo da média de criminalidade da esmagadora maioria dos países.
– A abertura das fronteiras tornou-nos mais vulneráveis à entrada de máfias de leste e outras organizações de crime organizado.
– Isso combate-se com reforço e articulação cada vez maior com as forças dos outros países. No ano passado detivemos 38 cidadãos de leste que se dedicavam ao furto de ouro em residências. Era uma organização bem montada e estruturada e conseguimos detê--los graças às informações recolhidas da polícia espanhola.
PERFIL
Francisco Maria Oliveira Pereira nasceu há 59 anos, em Lisboa. Licenciado em Ciências Militares pela Academia Militar, ascende a capitão do Exército, em 1980, e a Major, em 1987. É com esta patente que, após estágio de actualização, entra na PSP. Em 1985 comanda a PSP de Macau e, em 1992, é nomeado subdirector do Instituto Superior da PSP. Dois anos depois, o então primeiro-ministro Cavaco Silva nomeia-o oficial de Segurança. Em 1999, chega à chefia das operações da Direcção Nacional e, em 2003, ao Comando da PSP de Lisboa. No mês de Março de 2008, o ministro Rui Pereira nomeia-o director nacional da PSP. É casado e tem dois filhos.
Francisco Oliveira Pereira, director nacional da PSP, diz que a eventual unificação com GNR e PJ, dando origem a um corpo de polícia com vertentes de investigação e patrulhamento, é “questão política” mas, “provavelmente”, a solução para travar dispersão de meios e dar melhores condições de vida aos polícias
Correio da Manhã – No contexto actual qual é o papel da PSP no combate à criminalidade violenta?
Oliveira Pereira – É determinante, na dependência funcional do Ministério Público (MP). A PSP tem preferencialmente áreas urbanas. Ali estão bairros e zonas sensíveis, focos de instabilidade e, por vezes, de grande perturbação pública. Estamos a atingir objectivos, com uma monitorização permanente, um policiamento de proximidade dirigido e repressão coordenada e proporcional. Temos tido sucesso nisso.
– MP e PJ atacam-se frequentemente por causa da atribuição à PSP e GNR de investigações que a lei orgânica diz serem da competência exclusiva da PJ, como os crimes com armas de fogo.
– É verdade, mas o MP também pode delegar noutras forças essas atribuições. Pode haver aqui alguma contradição, mas não sou jurista. A realidade é esta. E o MP tem utilizado esse processo para delegar na PSP muitas investigações.
– A aposta na investigação não põe em causa a vertente de segurança pública, o patrulhamento?
– De maneira alguma. É indissociável a investigação criminal da ordem pública – pessoal no terreno, informações dos agentes que andam na rua. No combate ao crime violento, um factor para o sucesso é o de haver boas e melhores informações policiais.
– Precisa de mais agentes?
– Preciso sempre. Vai haver, a curto prazo, uma nova escola. Está a decorrer um curso de investigação criminal. Temos orientado todo o esforço em virtude das nossas competências – e naquelas que nos são delegadas pelo MP.
– Existe uma guerra de protagonismo entre polícias, com prejuízo das investigações em causa?
– Custa-me a acreditar, pois o MP, como entidade reguladora, faz o seu papel. Mas é natural que, pontualmente, haja um ou outro conflito menos agradável.
– Como funciona a partilha de informações entre a PSP e GNR?
– Nunca funcionou tão bem como nos últimos dois anos. Há uma disponibilidade completamente diferente, incentivada pelo secretário-- geral da Administração Interna.
– Essa partilha existe em relação à PJ, com mais competências mas menos meios no terreno?
– Sim, diariamente comprovada. Quando as competências são da PJ, são-lhe transmitidas as informações. Não quer dizer que funcione em pleno, mas é obrigatório que exista. Os resultados são evidentes.
– Seria útil a PSP ter meios para efectuar as suas escutas telefónicas, perícias a armas e na área de lofoscopia (impressões digitais), tornando-se independente da PJ?
– Em relação às armas estamos a estudar uma eventual proposta nesse sentido. Era capaz de dar uma maior eficácia. Quanto às escutas e lofoscopia, também seria uma solução que cada um de nós pudesse ter a sua autonomia.
– Como encara uma possível unificação de polícias, originando uma polícia nacional, com vertentes de investigação e de policiamento?
– Tenho uma opinião muito particular, mas, sendo uma questão política, não vou poder dizê-la na condição de director nacional.
– Num país pequeno, de fracos recursos, justifica-se uma duplicação de meios com a GNR no que diz repeito às operações especiais?
– Há duas forças com áreas distintas de actuação, competências distintas e, naturalmente, quer a GNR quer a PSP, se querem uma polícia integral, têm de ter todos os meios à disposição para fazer face ao crime violento.
– Sendo os agentes mal pagos, a unificação, sem esta dispersão de meios financeiros, não permitiria melhores condições de vida para os polícias, por exemplo?
– Pois, provavelmente essa solução iria resolver uma séria de problemas. Repito: é uma questão política, não me pronuncio.
– Agrada-lhe o modelo de polícia única em países estrangeiros?
– Apenas de um ponto de vista técnico, posso avaliar a experiência dos outros países, reconhecendo neles virtudes...
'MAIS AGENTES A COMETER CRIMES, MAS PUNIDOS'
CM – Os sindicatos pronunciam-se muitas vezes sobre questões operacionais e não laborais.
– Esse é o paradoxo. A que propósito? São muitas vezes dadas opiniões desajustadas por questões operacionais e os sindicatos devem preocupar-se com as condições de trabalho dos polícias.
– E nesse aspecto têm razão?
– Têm. Foram descuradas durante muitos anos as questões de manutenção e criação de novas infraestruturas, de dignificação de espaços de trabalho da polícia.
– Mas onde mais lhes dói é nas condições salariais. Os polícias ganham manifestamente mal.
– É uma realidade também.
– Os subsídios de risco...
– Sou contra subsídios de risco. Sou é por um vencimento digno e compatível com o risco, com a ameaça, com as agruras de trabalhar por turnos. Isso deve ser pago, não à custa de subsídios.
– E está a ser pago?
– Não, acho que fica aquém daquilo que podia ser. Mas essa é uma negociação da direcção da polícia com o Governo e o MAI está sensível a essa problemática.
– Com o poder que os polícias detêm, as dificuldades económicas por que passam não os tornam mais permeáveis a cometer crimes como corrupção?
– Não acredito que as pessoas, por terem mais ou menos capacidade económica, tenham mais tendência para se deixarem corromper. A PSP tem o controlo do IGAI, do MP, mas também interno. Em 2009 tivemos oportunidade de enviar para aposentação compulsiva 15 elementos policiais e, para demissão, 24.
– Por crimes cometidos?
– Por crimes, vários. É a prova – e nunca num ano anterior tinha ocorrido um número tão elevado – de que temos os mecanismos e estamos a utilizá-los.
– Mas é também a prova de que há mais polícias a cometer crimes.
– É provável, mas são punidos.
'ARTICULAÇÃO COM OUTROS PAÍSES'
CM – Portugal é um país seguro?
O.P. – As provas são, até, internacionais. Em termos mundiais, estávamos em 9º lugar entre os países mais seguros e, a nível europeu, estamos muito abaixo da média de criminalidade da esmagadora maioria dos países.
– A abertura das fronteiras tornou-nos mais vulneráveis à entrada de máfias de leste e outras organizações de crime organizado.
– Isso combate-se com reforço e articulação cada vez maior com as forças dos outros países. No ano passado detivemos 38 cidadãos de leste que se dedicavam ao furto de ouro em residências. Era uma organização bem montada e estruturada e conseguimos detê--los graças às informações recolhidas da polícia espanhola.
PERFIL
Francisco Maria Oliveira Pereira nasceu há 59 anos, em Lisboa. Licenciado em Ciências Militares pela Academia Militar, ascende a capitão do Exército, em 1980, e a Major, em 1987. É com esta patente que, após estágio de actualização, entra na PSP. Em 1985 comanda a PSP de Macau e, em 1992, é nomeado subdirector do Instituto Superior da PSP. Dois anos depois, o então primeiro-ministro Cavaco Silva nomeia-o oficial de Segurança. Em 1999, chega à chefia das operações da Direcção Nacional e, em 2003, ao Comando da PSP de Lisboa. No mês de Março de 2008, o ministro Rui Pereira nomeia-o director nacional da PSP. É casado e tem dois filhos.
Uma Alegoria muito actual
O velhinho disse:
"Bom, o senhor sabe... é como uma tartaruga em cima do poste...".
Sem saber o que o almeida queria dizer, o médico perguntou o que significava uma tartaruga em cima dum poste.
E o almeida respondeu:
"É quando o senhor vai indo por um caminho fora, vê um poste e lá em cima vê uma tartaruga a tentar equilibrar-se".
É isso é uma tartaruga num poste.
Diante da cara de interrogação do médico, o velho acrescentou:
Não se entende como ela chegou lá;
Não se acredita que ela esteja lá;
Sabe que ela não subiu lá sozinha;
Sabe que não deveria nem poderia estar lá;
Sabe que ela não vai fazer absolutamente nada enquanto estiver lá;
Não entende porque a colocaram lá;
"Então tudo o que temos a fazer é ajudá-la a descer de lá, e providenciar para que nunca mais suba, pois lá em cima definitivamente não é o lugar dela".
(Recebido por mail, anónimo)
"Bom, o senhor sabe... é como uma tartaruga em cima do poste...".
Sem saber o que o almeida queria dizer, o médico perguntou o que significava uma tartaruga em cima dum poste.
E o almeida respondeu:
"É quando o senhor vai indo por um caminho fora, vê um poste e lá em cima vê uma tartaruga a tentar equilibrar-se".
É isso é uma tartaruga num poste.
Diante da cara de interrogação do médico, o velho acrescentou:
Não se entende como ela chegou lá;
Não se acredita que ela esteja lá;
Sabe que ela não subiu lá sozinha;
Sabe que não deveria nem poderia estar lá;
Sabe que ela não vai fazer absolutamente nada enquanto estiver lá;
Não entende porque a colocaram lá;
"Então tudo o que temos a fazer é ajudá-la a descer de lá, e providenciar para que nunca mais suba, pois lá em cima definitivamente não é o lugar dela".
(Recebido por mail, anónimo)
segunda-feira, 12 de abril de 2010
Entrevista a João Palma , Presidente do SMMP
João Palma, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, não tem dúvidas de que anda a ser escutado e acusa o grupo parlamentar do PS de destruir o trabalho positivo que o ministro da Justiça anda a fazer.
Correio da Manhã/Rádio Clube – O dia-a-dia entre os agentes da Justiça é de guerra aberta, com acusações mútuas de bloqueio de investigações?
João Palma – Isso é o resultado da falta de uma política que tenha como objectivo coordenar o titular da investigação criminal, que é o Ministério Público, e os órgãos de polícia criminal.
ND – Não está definido, não é claro?
- Está definido, há a lei da organização da investigação criminal. O que nos parece é que essa lei não faz aquilo que devia fazer.
ARF – Não faz o quê?
- Não coordena os órgãos de polícia criminal, quer entre eles, com partilha de poder e informação, quer a relação da PJ, PSP e GNR e outros com o Ministério Público. Há um espartilho grande entre o titular da investigação e os órgãos de polícia criminal.
ARF – É uma situação que já se arrasta há bastante tempo, não é?
- É uma situação que não é de agora, mas obviamente que se tem vindo a degradar.
ARF – Por falta de autoridade, de liderança no Ministério Público?
- Nós temos dito que o Ministério Público padece de falta de energia na investigação.
ARF – E de quem é a culpa?
- Há duas razões. Uma é interna, de falta de organização do Ministério Público. E por razões externas. Que o poder legislativo impõe, por via do Governo e da Assembleia da República. Em vez de se criar um quadro legal em que essa coordenação seja efectiva, cria-se muitas vezes um sistema em que o Ministério Público trabalha para um lado e as polícias trabalham para outro. Nós temos dito, por exemplo em relação à Polícia Judiciária, que é claramente um corpo bicéfalo, com duas cabeças.
ARF – A Judiciária.
- A Judiciária. Nós defendemos que deve haver uma maior aproximação entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público.
ND – PJ tutelada pelo procurador–geral da República?
- Nós não temos soluções fechadas sobre essa matéria. Há quem defenda que deve ser o procurador-geral da República a nomear o director nacional da Polícia Judiciária. Será uma solução. Haverá outras. Agora, o que é fundamental é acabar com este espartilho que há entre o Ministério Público e a Judiciária que dá azo a todo este tipo de questiúnculas e de guerras que não prestigiam ninguém. As duas entidades são as mais prejudicadas por essa visão política, por essa descoordenação.
ND – Essas guerras só existem no topo? O dia-a-dia é diferente?
- Tem que dizer-se que no dia-a-dia a coordenação é boa e a relação entre magistrados e investigadores é normal e saudável. Mas não é o sistema que fomenta essa coordenação. Depende da capacidade das pessoas para o fazerem.
ND – Depende das pessoas?
- É muito casuístico. Mas como a lei trabalha no sentido contrário, no sentido de cultivar uma relação de confronto e de tensão, algumas pessoas do Ministério Público e da Polícia Judiciária ainda não perceberam que quando assumem determinadas posições estão, no fundo, a ser instrumentalizadas por alguém que quer afastar ainda mais as duas entidades. É uma tentativa política que passam, nomeadamente, pelo esvaziamento das competências da PJ.
ND – Quem é que tem esse interesse?
- São conhecidas tentativas de unificação das polícias, são conhecidas guerras dentro dos próprios Governos para passar a tutela da Judiciária para a Administração Interna. Essas guerras políticas têm efeitos negativos na coordenação entre as polícias. E enquanto essa guerra existir sai prejudicado o Ministério Público e as próprias polícias. E até se fala na extinção da PJ. Repare que neste momento tem metade dos quadros que devia ter.
ARF – Mas houve graves acusações à PJ. Que não investiga casos de crimes violentos quando as informações vêm da PSP ou GNR. Isto é verdade?
- Isso foi uma acusação feita por um colega meu. Penso que poderão ser situações isoladas. Os resultados que a PJ apresenta são razoáveis. Mas repito. No fundo há aí estratégias que têm a ver com a partilha do poder entre a PJ e a PSP, leia-se entre o Ministério da Justiça e o Ministério da Administração Interna, guerras essas às quais o Ministério Público, e é esse o apelo que faço aos meus colegas, é alheio, são guerras que não são nossas, nas quais nós, e a PJ, somos instrumentos e os primeiros prejudicados.
ARF – Isso leva-nos ao poder político, que assiste a essa situação. O poder político divide para reinar?
- Não tenho dúvidas em relação a isso. O poder político é responsável por esta situação. Pergunto qual é o interesse em manter esta guerra latente entre o Ministério Público e a PJ. Não tenho dúvidas que não é do interesse nem de uma nem de outra entidade. Quem tem interesse nisto é quem devia pugnar por uma investigação criminal eficiente e está mais preocupado em dividir do que em coordenar.
ND – Essas guerras contribuem para o atraso na Justiça?
- É apenas mais um dos exemplos de falta de visão global que há do sistema de justiça, de visão estratégica, de falta de investimento ao nível da política de justiça. Este Governo, e bem em muitos casos, tem andado a tentar resolver as asneiras que se fizeram nos últimos quatro anos. Foi uma maioria parlamentar completamente desperdiçada. Mas está a ver. A justiça no fundo não é uma gincana por causa dos sindicatos, dos magistrados, dos funcionários ou dos agentes de investigação.
ARF – Passa tudo pelo poder político?
- É uma gincana porque o poder político gere e manipula a justiça através de diplomas legislativas ao sabor das conjunturas, dos interesses pontuais, do que interessa hoje mas que não interessa amanhã. Andamos nisto. É preciso que os portugueses saibam que a justiça funciona mal por falta de visão estratégica do poder político. Como diz o ministro da Justiça, há muitas leis e a maior parte é má.
ARF – Um ministro que tem responsabilidades há muitos anos.
- Sim. Isso é verdade. Mas pior do que errar é não reconhecer o erro.
ND – Mas o que é que tem sido feito por este Governo para que a justiça melhore? Há algo de relevante que esteja a acontecer?
- Ainda bem que pergunta isso. Sobretudo há uma atitude diferente por parte da equipa do Ministério da Justiça. Não é por acaso que falo em equipa. Há uma atitude diferente de reconhecimento da legitimidade de intervenção das associações sindicais da justiça, num altura em que algumas personalidades põem em causa essa legitimidade.
ARF – Têm sido chamados ao Ministério da Justiça?
- Sim. Ainda há dias o senhor ministro da Justiça disse que os sindicatos são imprescindíveis em democracia. Agora é preciso que essa prática de diálogo e de aproximação corresponda a algo de mais efectivo.
ND – Sim, não basta que o sindicato seja reconhecido.
- Claro que não. Mas deixe-me que lhe diga outra coisa. Não podemos pensar que há dois partidos de apoio ao Governo. Há o partido ligado ao Governo, com uma facção liderada pelo senhor ministro da Justiça, e por outro lado haver o partido da Assembleia da República onde determinados membros do grupo parlamentar, não tanto o seu presidente, mas outras pessoas influentes, designadamente o doutor Ricardo Rodrigues, que insistem numa atitude constante de afrontamento dos magistrados, no fundo de continuidade da política seguida nos últimos quatro anos.
ARF – Isto é a história do polícia bom e do polícia mau? O bom é o ministro da justiça e o mau é o deputado Ricardo Rodrigues?
- E que além de deputados tem outras pessoas. Parece que estão a trabalhar para essa facção ligada a esse deputado. Não são só deputados. Basta ouvi-los e lê-los. Há uns ponta de lança dessa facção socialista que visa muito objectivamente atacar os magistrados em público. Não sei se é para nos pôr ao nível deles, provavelmente será, mas é negativa que exista uma patrulha da GNR, digamos assim, um guarda que é bom e um guarda que é mau. O sindicato não estará disponível para trabalhar bem com o senhor ministro da Justiça e trabalhar mal com o Parlamento. Era o que faltava.
ARF – Não aceitam esse jogo?
- Nós já temos alguma experiência e sabemos que é preciso ter algum cuidado nestas questões de negociações políticas. A experiência ensina-nos que todo o cuidado é pouco. Não estamos minimamente disponíveis para sermos enganados.
ND – O diálogo actual é só um processo de intenções?
- Há alguma acção concreta boa. É preciso é que desse diálogo resulte alguma coisa. Que olhem, por exemplo, para as nossas propostas sobre o processo penal.
ARF – Esses ataques aos magistrados dentro do PS, nomeadamente no grupo parlamentar, acontecem porquê? Têm medo que a investigação criminal funcione a sério?
- Não sei se algumas pessoas do grupo parlamentar do PS e de outros partidos têm ou não receio. O que eu lhe garanto é que se as coisas não funcionam melhor é porque eles não querem. Porque eles é que estão no Parlamento e fazem as leis. A ideia que dá é que de facto as pessoas estão mais interessadas em que isto não funcione.
ARF – Agora também se ataca os magistrados por estarem ligados aos jornalistas, há uma promiscuidade enorme, são eles que divulgam os processos. Ainda recentemente foram acusados disso na Comissão de Ética do Parlamento pelo jornalista Emídio Rangel.
- Não sei quem é que esse vosso colega ofendeu mais. Se foram os magistrados se foram os próprios colegas de profissão. Se eu fosse colega dele sentir-me-ia ainda mais ofendido do que como magistrado.
ARF – Isso é normal. Eu também me sinto. Mais envergonhado.
- Agora, lá está. É mais um ponta de lança no ataque às magistraturas. Há outros pontas de lança.
ARF – O sindicato vai processá-lo?
- Vai ser processado. O sindicato vai avançar com uma queixa-crime contra esse jornalista. Outras pessoas já deveriam ter merecido semelhante tratamento. Porque são ditas barbaridades por pessoas que têm responsabilidades no País, pessoas que fizeram e desfizeram a reforma agrária, por exemplo.
ARF – Está a falar de António Barreto.
- Sim. As pessoas quando falam têm de ter sentido de responsabilidade. Não podem abrir a boca e dizer as asneiras que lhes apetece. As pessoas ofendem-se. Num País em que os políticos dizem tudo uns aos outros e ninguém se ofende os magistrados ainda se ofendem. E desta vez decidimos acabar com os níveis de tolerância que temos tido até agora.
ARF – Como é que encara a proposta de os magistrados passarem a revelar publicamente os seus rendimentos?
- Devo dizer-lhe que logo que fomos ouvidos na comissão que está a discutir medidas contra a corrupção a pergunta foi-nos feita. E nós dissemos que os magistrados não vêem razões para não divulgarem os seus rendimentos. Quem não deve não teme. Agora, o que é curioso, o que é lamentável, é pobre e é triste que se eleja essa medida como a grande medida de combate à corrupção, como foi apresentada esta semana como a grande medida do PS. Isto é brincar com as pessoas, mais do que brincar com os magistrados.
ARF – A corrupção não passa pelos magistrados?
- Não digo que não haja magistrados corruptos. Eu não os conheço. Se o doutor Ricardo Rodrigues os conhece deveria dizer quais são. Provavelmente conhecerá algum. Eu não conheço. Mas é óbvio para toda a gente que a corrupção não passa por aí.
ARF – Essa medida não é também para atacar os magistrados?
- É evidente que sim.
ARF – Para lançar suspeitas.
- Claro. Os magistrados não se preocupam com isso. Agora é negativo e enquadra-se nessa política do PS de dois pesos e duas medias em relação aos magistrados. O ministro da Justiça já se demarcou dessa medida. E depois anda alguém a destruir o trabalho do ministro da Justiça.
ARF – Voltamos à história do PIDE mau e do PIDE bom.
- Pois é.
ND – A questão é saber quem é que tem o poder. É o bom ou o mau?
- Pois. É nenhum ou são os dois. Mas repare. Já dissemos que se o ministro da Justiça não se distanciar o suficiente de determinados poderes dentro do Governo, sejam poderes vindos do Ministério da Administração Interna, que quis mandar na Justiça, sejam das Finanças, sejam de determinados elementos dentro do grupo parlamentar, de que salvaguardo o presidente que ainda não disse nada sobre a matéria. E gostava de o ouvir dizer o que é que acha disto, que foi dito por um deputado.
ARF – É vice-presidente.
- Isso. Vice-presidente. É preciso saber o que é que o presidente acha sobre isso. E ainda não o ouvi dizer nada. Se concorda com o ministro da Justiça ou se está do lado do seu vice-presidente. A atitude em relação aos magistrados tem de ser definida. E não pode ser uma à quinta-feira e outra à sexta e ao sábado. Os magistrados exigem que não se brinque com eles. O sindicato não está minimamente disponível para entrar nessa coboiada.
ND – Essa comissão sobre a corrupção tem dado alguma coisa de útil?
- Tem havido boas intervenções. O próprio sindicato apresentou algumas numa intervenção de hora e meia. Espero que o doutor Vera Jardim consiga descolar destas tentativas de politização feitas por alguns membros da comissão e consiga reunir propostas sérias e objectivas contra a corrupção. Nós não podemos dizer aos portugueses que queremos punir tudo e depois não punimos nada. Chega desde discurso.
ARF – Os meios existentes para investigar crimes económicos e de corrupção são ou não obsoletos?
- Vou dar-lhe um exemplo. Toda a gente fala das escutas. Eu queria dizer aqui que o problema não são as escutas que se fazem no processo, que passam pelo crivo da polícia, de um magistrado do Ministério Público e de um juiz de instrução criminal. Não são
essas as escutas que me preocupam nem preocupam as pessoas de bem e que não têm problemas com a justiça.
ARF – Quais são as que o preocupam?
- O problema das escutas neste País são as escutas que são feitas ilegalmente, fora deste esquema e que toda a gente sabe que existem.
ARF – Toda a gente?
- É o procurador-geral a dizer que ouve barulhos no telemóvel, o ministro da Justiça a dizer que já falou com mais à vontade no telemóvel e tem-me a mim a dizer a mesma coisa. Eu sei que sou escutado no meu telemóvel, Se me disser para o provar eu também não o posso provar.
ARF – Essas escutas são usadas como pressão sobre as pessoas?
- Essas escutas são escutas que não são feitas pelo sistema legal, pelo sistema processual, são feitas por pessoas e entidades fora do sistema legal, sem qualquer crivo, sem qualquer fiscalização. São perigosas, porque são arbitrárias, feitas em função de interesses inconfessáveis e que são usadas para fazerem chantagens pessoas e políticas. É preciso que os cidadãos tenham essa noção.
ARF – Não há nenhuma autoridade com capacidade para impedir e perseguir os autores dessas escutas?
- Se os mais altos responsáveis da justiça em Portugal dizem que são escutados como é que não se abre um inquérito criminal, como é que não se põe a PJ com meios suficientes para apanhar os autores dessas escutas? Já viu alguém investir numa investigação dessas ou alguém dizer que vai dotar a PJ de meios para combater essas escutas? Ninguém se preocupa com isso. Isto é, às vezes o mais importante é o que não se sabe.
ARF – É uma verdadeira face oculta?
- Sim, a face oculta não é a que se tem falado ultimamente, mas uma outra face oculta em que as informações são utilizadas sabe Deus com que objectivos. Essas é que são perigosas e que me assustam.
ARF – Também se fala da contaminação política do Ministério Público, da Judiciária e da Justiça em geral. É um caldo de cultura horrível, não é?
- É desprestigiante para a justiça, Que o seja para os políticos preocupo-me pouco, não como cidadão, que me preocupo muito. Não se pode dar ideia que o sistema de justiça é fraco com os fortes e forte com os fracos. E infelizmente tem sido. Muito por culpa das cúpulas do sistema de justiça.
ARF – Sente que esta contaminação política tem vindo a aumentar nos últimos tempos? Ou tem sido uma constante ao longo dos anos?
- Devo reconhecer que se tem agravado nos últimos meses. Sem dúvida. Muito por culpa do poder político, que não se consegue desligar o suficiente da actividade judicial. Muitas vezes até aparece em público a apoiar ou a criticar este ou aquele magistrado. Manifestações que seriam dispensáveis. E essa politização também nos prejudica.
ARF – Mas também há quem se ponha a jeito para receber esse apoio político. A culpa não é só do poder político, pois não?
- Sabe que as tentativas de domínio do poder judicial são grandes e nem sempre as pessoas conseguem libertar-se das teias políticas que lhes querem impor. E reconheço que é muito difícil, sobretudo para as cúpulas das magistraturas, libertarem-se dessa teia política em que os querem envolver. Mas é preciso ter essa coragem, é preciso ter essa força, ter essa determinação e mostrar cá para fora que de facto são magistrados que estão ali para cumprir de acordo com ditames da Constituição. E a Constituição diz-nos que não há portugueses de primeira e de segunda. Às vezes essa força existe, ma há casos em que dá ideia de ter claudicado.
ARF – No caso ‘Face Oculta’ houve decisões que puseram em causa a idoneidade e a coragem do procurador-geral da República, Pinto Monteiro?
- Não sei se houve falta de coragem. A posição do sindicato é muito clara. Nós entendemos que face ao que veio a público o normal seria abrir-se uma investigação criminal. Envolvesse ela quem envolvesse. Era isso que nós esperávamos. Embora saiba que não é indiferente abrir-se um inquérito a uma pessoa ou outra. Mas lá está. É preciso coragem. Mas cabe ao senhor procurador-geral explicar porque não o fez.
ARF – Ainda não o fez.
- Tem feito várias tentativas.
ARF – Todas falhadas. Tem vindo a falhar, não tem? De cada vez que tenta explicar fica tudo mais confuso.
- É o que as pessoas dizem.
ARF – Não acha que a figura do procurador-geral da República ficou fragilizada?
- É óbvio que a sua situação foi de alguma forma questionada em função desses factos. Não é a situação que já foi. Haverá que dar tempo para clarificar a situação.
ARF – O novo líder do PSD já pediu a sua demissão.
- Como calcula é uma posição que não vou comentar. A avaliação das condições para o exercício do cargo cabe ao senhor Presidente da República e ao senhor primeiro-ministro.
ARF – O Presidente da República já disse que não pode dizer em público o que pensa.
- Pois. E nós ficamos sem saber o que pensa sobre isso. Agora, o sindicato pensa que é preciso reforçar a imagem do Ministério Público e que a imagem de eficácia tem de ser recuperada e aquilo que esperamos é que o senhor procurador-geral possa contribuir com os seus poderes, que são muitos, para que isso possa acontecer.
ARF – As relações do sindicato com Pinto Monteiro já estão melhores ou continuam na mesma? Isto é, más?
- São conhecidas as divergências grandes entre o sindicato e o senhor procurador-geral. Não há que ocultar nada. Agora, o que eu gostaria era que fosse possível que ouvisse melhor as propostas do sindicato, que afinal o sindicato não tem aquela postura negativa e destrutiva que algumas pessoas o querem convencer que o sindicato tem. Espero que se liberte também dessas tentativas de o influenciar contra o sindicato e que perceba que o sindicato é uma força dentro do Ministério Público, com uma capacidade muito grande, é representativo do que pensam os magistrados e é incontornavelmente uma entidade que tem de ser ouvida em tudo o que diz respeito às questões da justiça em geral e do Ministério Público em particular.
Correio da Manhã/Rádio Clube – O dia-a-dia entre os agentes da Justiça é de guerra aberta, com acusações mútuas de bloqueio de investigações?
João Palma – Isso é o resultado da falta de uma política que tenha como objectivo coordenar o titular da investigação criminal, que é o Ministério Público, e os órgãos de polícia criminal.
ND – Não está definido, não é claro?
- Está definido, há a lei da organização da investigação criminal. O que nos parece é que essa lei não faz aquilo que devia fazer.
ARF – Não faz o quê?
- Não coordena os órgãos de polícia criminal, quer entre eles, com partilha de poder e informação, quer a relação da PJ, PSP e GNR e outros com o Ministério Público. Há um espartilho grande entre o titular da investigação e os órgãos de polícia criminal.
ARF – É uma situação que já se arrasta há bastante tempo, não é?
- É uma situação que não é de agora, mas obviamente que se tem vindo a degradar.
ARF – Por falta de autoridade, de liderança no Ministério Público?
- Nós temos dito que o Ministério Público padece de falta de energia na investigação.
ARF – E de quem é a culpa?
- Há duas razões. Uma é interna, de falta de organização do Ministério Público. E por razões externas. Que o poder legislativo impõe, por via do Governo e da Assembleia da República. Em vez de se criar um quadro legal em que essa coordenação seja efectiva, cria-se muitas vezes um sistema em que o Ministério Público trabalha para um lado e as polícias trabalham para outro. Nós temos dito, por exemplo em relação à Polícia Judiciária, que é claramente um corpo bicéfalo, com duas cabeças.
ARF – A Judiciária.
- A Judiciária. Nós defendemos que deve haver uma maior aproximação entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público.
ND – PJ tutelada pelo procurador–geral da República?
- Nós não temos soluções fechadas sobre essa matéria. Há quem defenda que deve ser o procurador-geral da República a nomear o director nacional da Polícia Judiciária. Será uma solução. Haverá outras. Agora, o que é fundamental é acabar com este espartilho que há entre o Ministério Público e a Judiciária que dá azo a todo este tipo de questiúnculas e de guerras que não prestigiam ninguém. As duas entidades são as mais prejudicadas por essa visão política, por essa descoordenação.
ND – Essas guerras só existem no topo? O dia-a-dia é diferente?
- Tem que dizer-se que no dia-a-dia a coordenação é boa e a relação entre magistrados e investigadores é normal e saudável. Mas não é o sistema que fomenta essa coordenação. Depende da capacidade das pessoas para o fazerem.
ND – Depende das pessoas?
- É muito casuístico. Mas como a lei trabalha no sentido contrário, no sentido de cultivar uma relação de confronto e de tensão, algumas pessoas do Ministério Público e da Polícia Judiciária ainda não perceberam que quando assumem determinadas posições estão, no fundo, a ser instrumentalizadas por alguém que quer afastar ainda mais as duas entidades. É uma tentativa política que passam, nomeadamente, pelo esvaziamento das competências da PJ.
ND – Quem é que tem esse interesse?
- São conhecidas tentativas de unificação das polícias, são conhecidas guerras dentro dos próprios Governos para passar a tutela da Judiciária para a Administração Interna. Essas guerras políticas têm efeitos negativos na coordenação entre as polícias. E enquanto essa guerra existir sai prejudicado o Ministério Público e as próprias polícias. E até se fala na extinção da PJ. Repare que neste momento tem metade dos quadros que devia ter.
ARF – Mas houve graves acusações à PJ. Que não investiga casos de crimes violentos quando as informações vêm da PSP ou GNR. Isto é verdade?
- Isso foi uma acusação feita por um colega meu. Penso que poderão ser situações isoladas. Os resultados que a PJ apresenta são razoáveis. Mas repito. No fundo há aí estratégias que têm a ver com a partilha do poder entre a PJ e a PSP, leia-se entre o Ministério da Justiça e o Ministério da Administração Interna, guerras essas às quais o Ministério Público, e é esse o apelo que faço aos meus colegas, é alheio, são guerras que não são nossas, nas quais nós, e a PJ, somos instrumentos e os primeiros prejudicados.
ARF – Isso leva-nos ao poder político, que assiste a essa situação. O poder político divide para reinar?
- Não tenho dúvidas em relação a isso. O poder político é responsável por esta situação. Pergunto qual é o interesse em manter esta guerra latente entre o Ministério Público e a PJ. Não tenho dúvidas que não é do interesse nem de uma nem de outra entidade. Quem tem interesse nisto é quem devia pugnar por uma investigação criminal eficiente e está mais preocupado em dividir do que em coordenar.
ND – Essas guerras contribuem para o atraso na Justiça?
- É apenas mais um dos exemplos de falta de visão global que há do sistema de justiça, de visão estratégica, de falta de investimento ao nível da política de justiça. Este Governo, e bem em muitos casos, tem andado a tentar resolver as asneiras que se fizeram nos últimos quatro anos. Foi uma maioria parlamentar completamente desperdiçada. Mas está a ver. A justiça no fundo não é uma gincana por causa dos sindicatos, dos magistrados, dos funcionários ou dos agentes de investigação.
ARF – Passa tudo pelo poder político?
- É uma gincana porque o poder político gere e manipula a justiça através de diplomas legislativas ao sabor das conjunturas, dos interesses pontuais, do que interessa hoje mas que não interessa amanhã. Andamos nisto. É preciso que os portugueses saibam que a justiça funciona mal por falta de visão estratégica do poder político. Como diz o ministro da Justiça, há muitas leis e a maior parte é má.
ARF – Um ministro que tem responsabilidades há muitos anos.
- Sim. Isso é verdade. Mas pior do que errar é não reconhecer o erro.
ND – Mas o que é que tem sido feito por este Governo para que a justiça melhore? Há algo de relevante que esteja a acontecer?
- Ainda bem que pergunta isso. Sobretudo há uma atitude diferente por parte da equipa do Ministério da Justiça. Não é por acaso que falo em equipa. Há uma atitude diferente de reconhecimento da legitimidade de intervenção das associações sindicais da justiça, num altura em que algumas personalidades põem em causa essa legitimidade.
ARF – Têm sido chamados ao Ministério da Justiça?
- Sim. Ainda há dias o senhor ministro da Justiça disse que os sindicatos são imprescindíveis em democracia. Agora é preciso que essa prática de diálogo e de aproximação corresponda a algo de mais efectivo.
ND – Sim, não basta que o sindicato seja reconhecido.
- Claro que não. Mas deixe-me que lhe diga outra coisa. Não podemos pensar que há dois partidos de apoio ao Governo. Há o partido ligado ao Governo, com uma facção liderada pelo senhor ministro da Justiça, e por outro lado haver o partido da Assembleia da República onde determinados membros do grupo parlamentar, não tanto o seu presidente, mas outras pessoas influentes, designadamente o doutor Ricardo Rodrigues, que insistem numa atitude constante de afrontamento dos magistrados, no fundo de continuidade da política seguida nos últimos quatro anos.
ARF – Isto é a história do polícia bom e do polícia mau? O bom é o ministro da justiça e o mau é o deputado Ricardo Rodrigues?
- E que além de deputados tem outras pessoas. Parece que estão a trabalhar para essa facção ligada a esse deputado. Não são só deputados. Basta ouvi-los e lê-los. Há uns ponta de lança dessa facção socialista que visa muito objectivamente atacar os magistrados em público. Não sei se é para nos pôr ao nível deles, provavelmente será, mas é negativa que exista uma patrulha da GNR, digamos assim, um guarda que é bom e um guarda que é mau. O sindicato não estará disponível para trabalhar bem com o senhor ministro da Justiça e trabalhar mal com o Parlamento. Era o que faltava.
ARF – Não aceitam esse jogo?
- Nós já temos alguma experiência e sabemos que é preciso ter algum cuidado nestas questões de negociações políticas. A experiência ensina-nos que todo o cuidado é pouco. Não estamos minimamente disponíveis para sermos enganados.
ND – O diálogo actual é só um processo de intenções?
- Há alguma acção concreta boa. É preciso é que desse diálogo resulte alguma coisa. Que olhem, por exemplo, para as nossas propostas sobre o processo penal.
ARF – Esses ataques aos magistrados dentro do PS, nomeadamente no grupo parlamentar, acontecem porquê? Têm medo que a investigação criminal funcione a sério?
- Não sei se algumas pessoas do grupo parlamentar do PS e de outros partidos têm ou não receio. O que eu lhe garanto é que se as coisas não funcionam melhor é porque eles não querem. Porque eles é que estão no Parlamento e fazem as leis. A ideia que dá é que de facto as pessoas estão mais interessadas em que isto não funcione.
ARF – Agora também se ataca os magistrados por estarem ligados aos jornalistas, há uma promiscuidade enorme, são eles que divulgam os processos. Ainda recentemente foram acusados disso na Comissão de Ética do Parlamento pelo jornalista Emídio Rangel.
- Não sei quem é que esse vosso colega ofendeu mais. Se foram os magistrados se foram os próprios colegas de profissão. Se eu fosse colega dele sentir-me-ia ainda mais ofendido do que como magistrado.
ARF – Isso é normal. Eu também me sinto. Mais envergonhado.
- Agora, lá está. É mais um ponta de lança no ataque às magistraturas. Há outros pontas de lança.
ARF – O sindicato vai processá-lo?
- Vai ser processado. O sindicato vai avançar com uma queixa-crime contra esse jornalista. Outras pessoas já deveriam ter merecido semelhante tratamento. Porque são ditas barbaridades por pessoas que têm responsabilidades no País, pessoas que fizeram e desfizeram a reforma agrária, por exemplo.
ARF – Está a falar de António Barreto.
- Sim. As pessoas quando falam têm de ter sentido de responsabilidade. Não podem abrir a boca e dizer as asneiras que lhes apetece. As pessoas ofendem-se. Num País em que os políticos dizem tudo uns aos outros e ninguém se ofende os magistrados ainda se ofendem. E desta vez decidimos acabar com os níveis de tolerância que temos tido até agora.
ARF – Como é que encara a proposta de os magistrados passarem a revelar publicamente os seus rendimentos?
- Devo dizer-lhe que logo que fomos ouvidos na comissão que está a discutir medidas contra a corrupção a pergunta foi-nos feita. E nós dissemos que os magistrados não vêem razões para não divulgarem os seus rendimentos. Quem não deve não teme. Agora, o que é curioso, o que é lamentável, é pobre e é triste que se eleja essa medida como a grande medida de combate à corrupção, como foi apresentada esta semana como a grande medida do PS. Isto é brincar com as pessoas, mais do que brincar com os magistrados.
ARF – A corrupção não passa pelos magistrados?
- Não digo que não haja magistrados corruptos. Eu não os conheço. Se o doutor Ricardo Rodrigues os conhece deveria dizer quais são. Provavelmente conhecerá algum. Eu não conheço. Mas é óbvio para toda a gente que a corrupção não passa por aí.
ARF – Essa medida não é também para atacar os magistrados?
- É evidente que sim.
ARF – Para lançar suspeitas.
- Claro. Os magistrados não se preocupam com isso. Agora é negativo e enquadra-se nessa política do PS de dois pesos e duas medias em relação aos magistrados. O ministro da Justiça já se demarcou dessa medida. E depois anda alguém a destruir o trabalho do ministro da Justiça.
ARF – Voltamos à história do PIDE mau e do PIDE bom.
- Pois é.
ND – A questão é saber quem é que tem o poder. É o bom ou o mau?
- Pois. É nenhum ou são os dois. Mas repare. Já dissemos que se o ministro da Justiça não se distanciar o suficiente de determinados poderes dentro do Governo, sejam poderes vindos do Ministério da Administração Interna, que quis mandar na Justiça, sejam das Finanças, sejam de determinados elementos dentro do grupo parlamentar, de que salvaguardo o presidente que ainda não disse nada sobre a matéria. E gostava de o ouvir dizer o que é que acha disto, que foi dito por um deputado.
ARF – É vice-presidente.
- Isso. Vice-presidente. É preciso saber o que é que o presidente acha sobre isso. E ainda não o ouvi dizer nada. Se concorda com o ministro da Justiça ou se está do lado do seu vice-presidente. A atitude em relação aos magistrados tem de ser definida. E não pode ser uma à quinta-feira e outra à sexta e ao sábado. Os magistrados exigem que não se brinque com eles. O sindicato não está minimamente disponível para entrar nessa coboiada.
ND – Essa comissão sobre a corrupção tem dado alguma coisa de útil?
- Tem havido boas intervenções. O próprio sindicato apresentou algumas numa intervenção de hora e meia. Espero que o doutor Vera Jardim consiga descolar destas tentativas de politização feitas por alguns membros da comissão e consiga reunir propostas sérias e objectivas contra a corrupção. Nós não podemos dizer aos portugueses que queremos punir tudo e depois não punimos nada. Chega desde discurso.
ARF – Os meios existentes para investigar crimes económicos e de corrupção são ou não obsoletos?
- Vou dar-lhe um exemplo. Toda a gente fala das escutas. Eu queria dizer aqui que o problema não são as escutas que se fazem no processo, que passam pelo crivo da polícia, de um magistrado do Ministério Público e de um juiz de instrução criminal. Não são
essas as escutas que me preocupam nem preocupam as pessoas de bem e que não têm problemas com a justiça.
ARF – Quais são as que o preocupam?
- O problema das escutas neste País são as escutas que são feitas ilegalmente, fora deste esquema e que toda a gente sabe que existem.
ARF – Toda a gente?
- É o procurador-geral a dizer que ouve barulhos no telemóvel, o ministro da Justiça a dizer que já falou com mais à vontade no telemóvel e tem-me a mim a dizer a mesma coisa. Eu sei que sou escutado no meu telemóvel, Se me disser para o provar eu também não o posso provar.
ARF – Essas escutas são usadas como pressão sobre as pessoas?
- Essas escutas são escutas que não são feitas pelo sistema legal, pelo sistema processual, são feitas por pessoas e entidades fora do sistema legal, sem qualquer crivo, sem qualquer fiscalização. São perigosas, porque são arbitrárias, feitas em função de interesses inconfessáveis e que são usadas para fazerem chantagens pessoas e políticas. É preciso que os cidadãos tenham essa noção.
ARF – Não há nenhuma autoridade com capacidade para impedir e perseguir os autores dessas escutas?
- Se os mais altos responsáveis da justiça em Portugal dizem que são escutados como é que não se abre um inquérito criminal, como é que não se põe a PJ com meios suficientes para apanhar os autores dessas escutas? Já viu alguém investir numa investigação dessas ou alguém dizer que vai dotar a PJ de meios para combater essas escutas? Ninguém se preocupa com isso. Isto é, às vezes o mais importante é o que não se sabe.
ARF – É uma verdadeira face oculta?
- Sim, a face oculta não é a que se tem falado ultimamente, mas uma outra face oculta em que as informações são utilizadas sabe Deus com que objectivos. Essas é que são perigosas e que me assustam.
ARF – Também se fala da contaminação política do Ministério Público, da Judiciária e da Justiça em geral. É um caldo de cultura horrível, não é?
- É desprestigiante para a justiça, Que o seja para os políticos preocupo-me pouco, não como cidadão, que me preocupo muito. Não se pode dar ideia que o sistema de justiça é fraco com os fortes e forte com os fracos. E infelizmente tem sido. Muito por culpa das cúpulas do sistema de justiça.
ARF – Sente que esta contaminação política tem vindo a aumentar nos últimos tempos? Ou tem sido uma constante ao longo dos anos?
- Devo reconhecer que se tem agravado nos últimos meses. Sem dúvida. Muito por culpa do poder político, que não se consegue desligar o suficiente da actividade judicial. Muitas vezes até aparece em público a apoiar ou a criticar este ou aquele magistrado. Manifestações que seriam dispensáveis. E essa politização também nos prejudica.
ARF – Mas também há quem se ponha a jeito para receber esse apoio político. A culpa não é só do poder político, pois não?
- Sabe que as tentativas de domínio do poder judicial são grandes e nem sempre as pessoas conseguem libertar-se das teias políticas que lhes querem impor. E reconheço que é muito difícil, sobretudo para as cúpulas das magistraturas, libertarem-se dessa teia política em que os querem envolver. Mas é preciso ter essa coragem, é preciso ter essa força, ter essa determinação e mostrar cá para fora que de facto são magistrados que estão ali para cumprir de acordo com ditames da Constituição. E a Constituição diz-nos que não há portugueses de primeira e de segunda. Às vezes essa força existe, ma há casos em que dá ideia de ter claudicado.
ARF – No caso ‘Face Oculta’ houve decisões que puseram em causa a idoneidade e a coragem do procurador-geral da República, Pinto Monteiro?
- Não sei se houve falta de coragem. A posição do sindicato é muito clara. Nós entendemos que face ao que veio a público o normal seria abrir-se uma investigação criminal. Envolvesse ela quem envolvesse. Era isso que nós esperávamos. Embora saiba que não é indiferente abrir-se um inquérito a uma pessoa ou outra. Mas lá está. É preciso coragem. Mas cabe ao senhor procurador-geral explicar porque não o fez.
ARF – Ainda não o fez.
- Tem feito várias tentativas.
ARF – Todas falhadas. Tem vindo a falhar, não tem? De cada vez que tenta explicar fica tudo mais confuso.
- É o que as pessoas dizem.
ARF – Não acha que a figura do procurador-geral da República ficou fragilizada?
- É óbvio que a sua situação foi de alguma forma questionada em função desses factos. Não é a situação que já foi. Haverá que dar tempo para clarificar a situação.
ARF – O novo líder do PSD já pediu a sua demissão.
- Como calcula é uma posição que não vou comentar. A avaliação das condições para o exercício do cargo cabe ao senhor Presidente da República e ao senhor primeiro-ministro.
ARF – O Presidente da República já disse que não pode dizer em público o que pensa.
- Pois. E nós ficamos sem saber o que pensa sobre isso. Agora, o sindicato pensa que é preciso reforçar a imagem do Ministério Público e que a imagem de eficácia tem de ser recuperada e aquilo que esperamos é que o senhor procurador-geral possa contribuir com os seus poderes, que são muitos, para que isso possa acontecer.
ARF – As relações do sindicato com Pinto Monteiro já estão melhores ou continuam na mesma? Isto é, más?
- São conhecidas as divergências grandes entre o sindicato e o senhor procurador-geral. Não há que ocultar nada. Agora, o que eu gostaria era que fosse possível que ouvisse melhor as propostas do sindicato, que afinal o sindicato não tem aquela postura negativa e destrutiva que algumas pessoas o querem convencer que o sindicato tem. Espero que se liberte também dessas tentativas de o influenciar contra o sindicato e que perceba que o sindicato é uma força dentro do Ministério Público, com uma capacidade muito grande, é representativo do que pensam os magistrados e é incontornavelmente uma entidade que tem de ser ouvida em tudo o que diz respeito às questões da justiça em geral e do Ministério Público em particular.
terça-feira, 6 de abril de 2010
Artigo de Moita Flores
O Ministério Público
O País precisa de uma Justiça rápida, que condene ou absolva. Guerrinhas de privilégios não abonam virtudes.
No meio desta agonia confusa em que se debate a Justiça, onde confusão e a suspeição de conluios entre política e justiça vem todos os dias à baila, as últimas intervenções de alguns destacados magistrados do Ministério Público (MP) vieram ainda causar maior barafunda com uma sucessão de ataques contra a Polícia Judiciária (PJ). É certo que nunca ficou clara a relação entre MP e PJ, que existe uma bicefalia de comandos. O MP dirige o inquérito mas a PJ não depende dele. Tem dependência hierárquica ao Ministério da Justiça e autonomia técnica e táctica. Foi uma luta dura entre Juízes e Procuradores, que o MP ganhou mas a história destes vinte anos de vitória não corrobora a argumentação usada para agilizar a Justiça e melhor controlar e garantir a legalidade da investigação criminal. E é aquilo que se vê.
No que respeita à criminalidade violenta, onde a PJ continua a ter um protagonismo de forte visibilidade, pois são raros os processos deste tipo que são avocados pelo MP, não se percebe a violência das críticas. Basta que se consultem os números do ano de 2009. A PJ capturou perto de 850 autores/suspeitos deste tipo de crime. Mesmo com a vergonha que é a legislação sobre a prisão preventiva, mais de 50% desta rapaziada ficou presa preventivamente, ao mesmo tempo que desmantelou mais de cem grupos de assaltos à mão armada. Para não falar dos sucessivos êxitos no combate aos crimes de violação e outros de natureza sexual. Bem se pode dizer, que os números falam por si. E no que respeita ao crime económico, não consigo perceber o ataque desferido. Aquilo que se aguarda, com promessas reiteradas e sempre adiadas, é o fim do processo Freeport, da Operação Furacão, do processo da Amadora, Submarinos, Face Oculta e por aí adiante. São decisões de arquivamento ou de acusação.
E quem tem essa obrigação é o MP. E não o faz, permitindo a poluição política, a desconfiança, os julgamentos na praça pública, deixando destruir o carácter e a honra de possíveis inocentes e não dando destino a possíveis acusados. Não vale a pena tapar o sol com a peneira e bem desconfio que por detrás deste conjunto de ataques está um problema de luta pelo poder. É difícil de engolir uma direcção de PJ que, pela primeira vez desde a sua constituição, é liderada por profissionais de polícia, fazendo desaparecer uma série de tachos e privilégios da exclusiva pertença de magistrados. Manda a sensatez que esta guerrilha pare de vez. O País precisa de uma Justiça rápida. Para absolver ou para condenar. Guerrinhas de privilégios não abonam virtudes, apenas reflectem a grave situação a que chegámos.
O País precisa de uma Justiça rápida, que condene ou absolva. Guerrinhas de privilégios não abonam virtudes.
No meio desta agonia confusa em que se debate a Justiça, onde confusão e a suspeição de conluios entre política e justiça vem todos os dias à baila, as últimas intervenções de alguns destacados magistrados do Ministério Público (MP) vieram ainda causar maior barafunda com uma sucessão de ataques contra a Polícia Judiciária (PJ). É certo que nunca ficou clara a relação entre MP e PJ, que existe uma bicefalia de comandos. O MP dirige o inquérito mas a PJ não depende dele. Tem dependência hierárquica ao Ministério da Justiça e autonomia técnica e táctica. Foi uma luta dura entre Juízes e Procuradores, que o MP ganhou mas a história destes vinte anos de vitória não corrobora a argumentação usada para agilizar a Justiça e melhor controlar e garantir a legalidade da investigação criminal. E é aquilo que se vê.
No que respeita à criminalidade violenta, onde a PJ continua a ter um protagonismo de forte visibilidade, pois são raros os processos deste tipo que são avocados pelo MP, não se percebe a violência das críticas. Basta que se consultem os números do ano de 2009. A PJ capturou perto de 850 autores/suspeitos deste tipo de crime. Mesmo com a vergonha que é a legislação sobre a prisão preventiva, mais de 50% desta rapaziada ficou presa preventivamente, ao mesmo tempo que desmantelou mais de cem grupos de assaltos à mão armada. Para não falar dos sucessivos êxitos no combate aos crimes de violação e outros de natureza sexual. Bem se pode dizer, que os números falam por si. E no que respeita ao crime económico, não consigo perceber o ataque desferido. Aquilo que se aguarda, com promessas reiteradas e sempre adiadas, é o fim do processo Freeport, da Operação Furacão, do processo da Amadora, Submarinos, Face Oculta e por aí adiante. São decisões de arquivamento ou de acusação.
E quem tem essa obrigação é o MP. E não o faz, permitindo a poluição política, a desconfiança, os julgamentos na praça pública, deixando destruir o carácter e a honra de possíveis inocentes e não dando destino a possíveis acusados. Não vale a pena tapar o sol com a peneira e bem desconfio que por detrás deste conjunto de ataques está um problema de luta pelo poder. É difícil de engolir uma direcção de PJ que, pela primeira vez desde a sua constituição, é liderada por profissionais de polícia, fazendo desaparecer uma série de tachos e privilégios da exclusiva pertença de magistrados. Manda a sensatez que esta guerrilha pare de vez. O País precisa de uma Justiça rápida. Para absolver ou para condenar. Guerrinhas de privilégios não abonam virtudes, apenas reflectem a grave situação a que chegámos.
quinta-feira, 1 de abril de 2010
A Guerra entre o MP e a PJ. O Verniz estalou?
Depois de vários episódios (resumidos aqui):
- entrevista do procurador Adjunto Carlos Figueira no " Expresso" Lei diz que crimes com armas são da PJ, mas MP prefere operacionais da PSP e da GNR que conhecem melhor os suspeitos. Link (este link inclui comentários do próprio Carlos Figueira)
- noticia sobre o relatório da DIAP (leia-se de Maria José Morgado) que referiu que "Ao nível da Polícia Judiciária registam-se dificuldades graves no âmbito do combate ao crime especialmente violento e da criminalidade económico-financeira. Tais dificuldades traduzem-se na quase paralisação de certos processos no crime económico e na falta de objectivos estratégicos no crime violento." A análise é feita por Maria José Morgado, directora do DIAP de Lisboa, e consta do Relatório Anual de Actividades daquele departamento, documento a que o DN teve acesso.Link
- participação disciplinar (?) da PJ contra Carlos Figueira, vide aqui
Parece que a coisa está " em ponto de rebuçado" e que finalmente o PGR vai fazer uma reunião com o DN e os Procuradores Distritais.
Uma coisa parece-me segura: finalmente a aparente névoa de normalidade que Almeida Rodrigues está a dissipar-se a ver-se como vai o rei vestido....ou não.
A PJ precisa de uma revolução, na estrutura, nas relações laborais, nos objectivos e acima de tudo no exigir de uma cultura de exigência, na qual eu nao sei se o Procurador Carlos Figueira tem lugar.....
- entrevista do procurador Adjunto Carlos Figueira no " Expresso" Lei diz que crimes com armas são da PJ, mas MP prefere operacionais da PSP e da GNR que conhecem melhor os suspeitos. Link (este link inclui comentários do próprio Carlos Figueira)
- noticia sobre o relatório da DIAP (leia-se de Maria José Morgado) que referiu que "Ao nível da Polícia Judiciária registam-se dificuldades graves no âmbito do combate ao crime especialmente violento e da criminalidade económico-financeira. Tais dificuldades traduzem-se na quase paralisação de certos processos no crime económico e na falta de objectivos estratégicos no crime violento." A análise é feita por Maria José Morgado, directora do DIAP de Lisboa, e consta do Relatório Anual de Actividades daquele departamento, documento a que o DN teve acesso.Link
- participação disciplinar (?) da PJ contra Carlos Figueira, vide aqui
Parece que a coisa está " em ponto de rebuçado" e que finalmente o PGR vai fazer uma reunião com o DN e os Procuradores Distritais.
Uma coisa parece-me segura: finalmente a aparente névoa de normalidade que Almeida Rodrigues está a dissipar-se a ver-se como vai o rei vestido....ou não.
A PJ precisa de uma revolução, na estrutura, nas relações laborais, nos objectivos e acima de tudo no exigir de uma cultura de exigência, na qual eu nao sei se o Procurador Carlos Figueira tem lugar.....
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